domingo, 17 de junho de 2012

Bloody Rhodes - Conto 9 - "A Médica e o Monstro"


     A tempestade continua.  A chuva torrencial insiste em cair, quase como se quisesse lavar as ruas da pequena Colima. De fato, as ruas estavam imundas, repletas de lixo, lama e sangue. A polícia segue abismada tentando entender como e por que o padre Frederico foi cruelmente empalado pela cruz no altar no teto da Catedral Basílica. Alguns quilômetros adiante, no condomínio Barronuevo, o jovem Tito Banderas permanece em choque, sentado no canto da parede, observando os corpos mortos de seus pais. Perto dalí, o sangue de Eduardo Perez escorre pelo asfalto, enquanto o vigia Chavo Sanchez tenta desesperadamente ligar para a polícia para ir atrás do assassino de seu amigo, mas isso de nada adiantaria... Ramon Cortez, pelo menos o que sobrou dele, responsável pelos assassinatos em Barronuevo estava agora muito distante de lá, no banco de trás de um carro em Michoacán...  A direita de seu cadáver, a jovem Lilian Mulligan dormia um sono profundo, enquanto o sangue ainda escorria por suas presas.  No banco dianteiro, Jason Rhodes estaciona o carro calmamente, para fazer sua última “visita” antes do nascer do sol. Ele observa uma placa próxima a calçada. Necrotério Saint Germaine. “É aqui”, pensa o vampiro enquanto desce do veículo. Rhodes anda até a parte traseira do carro e abre a porta ao lado do cadáver de Ramon. Ele leva as mãos ao que sobrou do tronco do rapaz e o perfura.O vampiro quebra as costelas do morto, puxando-as para fora, rasgando a carne, para abrir caminho para o coração, e então o puxa de uma vez.Ele fecha o carro e anda pelas ruas molhadas em direção à entrada do prédio, enquanto seu corpo vai aos poucos se tornando transparente. Em segundos, ele some, como um fantasma.
     Dentro do necrotério, pouca atividade. Apenas uma médica permanece de plantão. Cuidadosamente, ela faz a perícia do, com sorte, ultimo corpo da noite. Vinte e oito anos, cerca de um metro e sessenta e três, morena, olhos castanhos, aparentemente saudável, mas com olheiras muito escuras, como se não tivesse descansado nas ultimas 72 horas, sem antecedentes criminais. Causa da morte: com certeza será seu péssimo gosto para amigos, ou seus hábitos “religiosos” não muito comuns. Ela escuta um barulho vindo da mesa ao lado, e se vira assustada, procurando sua origem. Encima da mesa, apenas um saco preto lacrado. Ela respira fundo e volta ao trabalho. Alguns instantes depois, a médica escuta o barulho novamente vindo da mesma direção, mas dessa vez, ela o ignora. Minutos depois ela escuta novamente um som vindo do saco, mas dessa vez, algo diferente, similar a uma risada abafada. Ela engole seco. A legista pega seu bisturi e anda lentamente até o saco. Silêncio total. Ela então começa a abrir o zíper vagarosamente, tomada pela tensão e pela curiosidade. Uma voz rasga o silêncio.
     - Doutora, to com um problema... Meu olho caiu, você pode colocar de volta? – diz Jason Rhodes, deitado dentro do saco preto, com seu olho decepado em suas mãos.
     - Porra Tom, não podia entrar pela porta como qualquer pessoa?! – reclama a mulher, gritando. Sua voz apresentava uma mistura de alívio e raiva.
     - Doutora Maya Pride... Quando foi que você perdeu seu senso de humor? – ri Jason, se levantando.
     - No mesmo lugar onde você perdeu sua humanidade Tom.
     - Tem certeza? Isso é meio longe daqui... – debocha o vampiro.
     - Vá pro inferno.
     - Bom te ver também Maya.
     Os dois se entreolham por alguns segundos. Ela ri.
     - O que veio fazer aqui Tom?
     - Vim te trazer um presente. Ah, e o nome agora é Jason – Rhodes põe a mão no casaco e joga o coração de Cortez na mesa. – Fresquinho.
     A Dra. Pride olha para o coração com satisfação. Jason sempre trazia material de boa qualidade... Com certeza serviria para o Ritual de Renascimento.
     - Obrigada Tom... Mas com certeza você não veio aqui apenas para me dar isso não é?
     - Esperta como sempre. Preciso que ache uma pessoa pra mim. E o nome agora é Jason, já falei.
     - Sempre com segundas intenções... Qual o nome da vítima dessa vez “Jason”?
     - William Ghastey. – responde Rhodes, sentado na mesa, brincando com o próprio olho – Ah, e preciso que você cole isso aqui na minha cara, esse visual de pirata não me cai bem.
     - Como perdeu ele dessa vez bebê? – Pergunta a médica enquanto anda até seu armário na outra sala.
     - Saí na porrada com o Darrel... Lembra dele? – Jason se levanta e segue a doutora. – E só pra avisar, sem essa do bebê, sou pelo menos duzentos anos mais velho que você.
     - Não estou te chamando de pequeno, só estou sendo carinhosa... Bebê. – debocha Maya enquanto leva uma maleta para a sala de autópsia.  – E sim, lembro dele.  Infelizmente, não de uma maneira boa. Foi ele que me caçou quando eu saí.
     - Tá mais morto que o cara na outra mesa agora.
     - Imaginei... Agora fica parado bebê.
     Maya abre a maleta, pega um saco de pó roxo e mistura com um pouco de um líquido vermelho e viscoso por alguns minutos, enquanto parece sussurrar algumas palavras incompreensíveis. Ela passa o líquido no rosto de Jason, desenhando alguma coisa, na ferida onde deveria estar seu olho. Ela recoloca o olho no lugar e joga um pouco do pó roxo na área.
     - Isso vai arder um pouco. – Fala a médica com a mão na bochecha de Rhodes.
     - Não me importo. Já passei por coisa pi...
     - Leha Turh Yee! – grita a Dra. Pride, para ativar a runa. Chamas Azuis queimam no rosto do vampiro, que se joga no chão berrando de dor. Ele se debate no piso por cerca de vinte segundos, até que o fogo se extingue.
     - Essa porra num arde um pouco não! Arde pra caralho! Porra... – resmunga Rhodes, enquanto passa a mão no olho recém restaurado, para checar se está tudo ok.
     - Pensei que já tivesse passado por coisa pior...
     - Engraçadinha... E o Ghastey, tem como achar?
     - Ter eu tenho, mas não agora. Não estou com os componentes necessários pra fazer um Ritual do Caçador aqui... Vou precisar de pelo menos dois dias para fazer os preparativos... Pra quê quer achar esse cara?
     - Ele é o novo “eleito” do Padrinho... Quero me livrar dele antes que seja transformado, pra o Padrinho entender com quem tá mexendo...
     - Tá com medinho de não ser mais o favorito? – Brinca Maya.
     - Você tá muito engraçadinha Maya...
     - Onde você perdeu seu senso de humor Tom?
     - Touché.
     - Mas então... Quer dar cabo dessa pobre alma só pra mandar um recado pro Chefão?
     - Também por isso. O outro motivo é que, de acordo com minhas fontes, Ghastey é influente demais nos governo do Canadá e de diversos países da América Central. Tá começando a crescer demais nos Estados Unidos, que é a área do Eli. Isso somado a influência do Padrinho na Europa e na Ásia... Vão dominar o mundo quase todo na minha frente, e daí pra tomar todo de uma vez de volta vai ser quase impossível.
     - Ainda com essa idéia maluca na cabeça?
     - Sempre com essa idéia maluca na cabeça.
     - Você falou no Eli... Como ele está? Não vá me dizer que ele aceitou fazer parte do seu plano insano?
     - Não só faz parte como também é um dos meus principais responsáveis por ele estar dando certo.
     - Você quase morreu da ultima vez que tentou Thomas.
     - Não planejei o suficiente da outra vez... E o nome agora é Jason. – respondeu Rhodes com o pensamento distante, como se estivesse perdido em alguma lembrança ruim. Ele leva os olhos ao relógio e suspira. – Acho que esta conversa vai ter que parar por aqui... O sol deve nascer em breve, e eu acho que não quero olhar pra ele hoje... Acompanha-me até a porta?
     - Claro... Por que não? – Sorri a doutora Pride. Ela se levanta e os dois caminham em direção ao carro de Jason no lado de fora.
     - Ligue pra esse número quanto terminar o Ritual. –Fala Jason entregando um cartão.
     - Pode deixar. Três dias no máximo.- A médica põe o cartão no bolso do jaleco.
Ao passarem pela porta, o vampiro abre um largo sorriso, como se tivesse lembrado uma velha piada e pergunta:
     - O Rudolf ainda te liga? – diz Jason, segurando uma gargalhada.
     - Thomas, isso já faz mais de doze anos!
     - Responda a pergunta.
     - Pelo menos uma vez por mês. – responde Maya, quase rindo.
     - HUHAUHAHUHAUUHAUUHAUHA... Que otário. Ele arrumou os dentes pelo menos?
     - Nunca.
     Jason e Maya chegam ao carro. Ele abre a porta e entra pronto para dar a partida, quando é interrompido pela médica, que observava atenta o banco de trás, com os olhos fixo em Lily.
     - Quem é essa, Tom?
     - É meu novo monstrinho...
     - O que aconteceu com a outra? O houve com a Carmen?
     - Não era boa o suficiente, acabou pirando e morreu.
     - Você sabe que eu não aprovo isso.
     - Você sabe que isso não faz diferença pra mim...
     O silêncio preenche a conversa por alguns segundos, até que Maya volta a falar.
     - Tenta não morrer.
     - Não vou.
     - Não vai tentar ou não vai morrer?
     - Não sei.
     - Adeus Thomas... Se cuide.
     - Até mais Maya... E o nome agora é Jason!  
     O vampiro liga o carro e dá a partida, acelerando pela estrada, até sair de vista.  Ultima tarefa no México cumprida. Próximo alvo traçado. Precisava agora encontrar um refúgio para si e para Lily até a próxima noite, e pensar numa maneira de despertá-la completamente...  Jason circula pela cidade até encontrar uma velha casa abandonada. Enquanto desce do carro para checar a “disponibilidade” da casa, o celular de Rhodes toca.
     - Tom, preciso de você no meu clube em San Diego o mais rápido possível. Não demore. Temos problemas – diz Elijah Jackson do outro lado da linha, com preocupação na voz.
     - Eli, eu acabei de passar alguns perrengues aqui no México, não dá pra esperar alguns dias não?
     - É sobre o Alexander.
     A linha fica muda por seis segundos. Rhodes respira fundo.  
     - Estarei aí no fim da noite. Preciso de um avião.
     - Terá um no aeroporto de Morelia esperando por você em três horas. Portão J16. Seu nome lá será Felipe Morelo.
     - A caminho. – Diz Jason desligando o telefone, e retornando ao carro.   Ele liga o GPS do celular e acelera pelas ruas em direção ao aeroporto, apressado.
     - Maldição... – pragueja Rhodes, enquanto os primeiros raios de sol começam a surgir no céu...

terça-feira, 15 de maio de 2012

Bloody Rhodes - Conto 8 - "Soldados de Madeira"


Condomínio Barronuevo, México, duas da manhã... As nuvens ainda cobrem o céu, apesar de a tempestade ter cessado. O silêncio seria total se não fossem os passos do vigia Eduardo Perez, que caminha pelas ruas do condomínio, desatento. Ele era um homem magro, na faixa dos 23 anos, carregando as marcas do cansaço e do tédio. Apesar de tudo, ele preferia assim. Afinal, muito melhor ser um guarda noturno entediado e de vida longa do que ter um trabalho emocionante e morrer cedo. Tinha dois filhos pra criar, não podia se arriscar demais com uma responsabilidade dessas. Claro que seu pai nunca concordaria com isso... no fundo no fundo, nem Eddie concorda com isso. Deveria ter seguido a carreira policial do irmão ao invés de se tornar um reles vigia. Mas o que um velho militar aposentado entenderia sobre responsabilidade ou sobre como o México é perigoso durante a noite? Bem, na verdade muito, e Eddie sabia que o coroa estava certo. Eduardo nunca tinha entrado na academia de polícia por pura incompetência. Não conseguia atirar, não conseguia intimidar... Não tinha nada que pudesse fazê-lo ser um bom policial, a não ser a vontade de fazer o certo. O vigia continua a caminhar pelas vielas do condomínio a passadas curtas, observando o céu nublado. De repente, seu rádio toca:
- Chavo? Algum problema? – Pergunta o vigia, atendendo a chamada.
- Pedi uns Burritos... Tá afim? – Responde Chavo, o outro vigia, com a boca cheia.
- Chego aí em um segundo... Tenta não comer tudo gorducho. – ri Eduardo correndo em direção a guarita. Afinal, o emprego era chato, mas tinha suas bonificações: um colega gordo que sempre compra comida pra dois.
Com os pensamentos no rango, o vigia nem percebe uma sombra se mexer a poucos metros dele, por cima de um dos muros do condomínio. Assim que ele se distancia, a sombra continua se esgueirando, com um papel em mãos e observando as portas, como se estivesse procurando uma casa em especial. Ela se arrasta furtivamente por alguns minutos até encontrar.
- Casa da família Banderas. – sussurra Ramon Cortez, respirando fundo. Era hora de cumprir sua missão. Hora de fazer a Justiça Divina recair sobre mais um pecador.
Ele segue rodeando a casa procurando uma entrada alternativa... Uma porta dos fundos, um muro baixo de quintal ou uma... Janela. Uma janela aberta. Ele não entendia como alguém dormiria de janela aberta nesse frio de congelar os ossos, mas aparentemente foi o que aconteceu. Com sorte, já seria o quarto de Hector e ele não teria que se arriscar mais ainda circulando pela casa. Começa a chover, ele se apressa. Cortez entra pela janela sem dificuldade, já tinha o hábito desde os 12 anos. Passado difícil o desse jovem...
 Filho de mãe solteira, o mais novo de um grupo de cinco... Trabalhavam em uma fábrica, todos eles, mal ganhando para o pão. Não se passou muito tempo sem que ele percebesse que não ia ganhar nada na vida ficando do lado certo da lei. Não nesse mundo cão, não nesse país dos infernos. Então ele começou com um pequeno furto aqui e ali... Depois alguns assaltos, venda de drogas... Ramon foi ficando cada vez mais seguro de si e mais afundado no crime. Ele tinha tudo que queria, na hora que queria. Claro que não ia demorar muito até que sua ganância o levasse a cargos mais altos no crime local. Chegou até a virar dono da boca de fumo de seu bairro. Foi aí que sua vida começou a descer ladeira abaixo. Ele claro, como todo vendedor de drogas, vendia barato no começo e depois aumentava o preço para sugar tudo que pudesse da clientela... e não se importava nem um pouco em ser “persuasivo” com quem não pagava em dia. Um dia ele foi “persuasivo” demais e quase matou um garoto viciado de pancada... E infelizmente pra Ramon, o menino era filho de um policial americano, que não deixou isso barato e forçou os tiras locais a darem um jeito em Cortez. Acabou sendo preso. Sua mãe morreu poucos dias depois da condenação, de desgosto. Na cadeia, ele não era exatamente bem tratado... Nem pelos guardas e nem pelos outros presos. Lá ele descobriu muitas outras novas formas de dor. Seus irmãos nunca iam visitá-lo. Tinha vergonha. Ramon estava sozinho, impotente, infeliz... Até que encontrou Jesus. Na religião ele encontrou forças pra continuar, para se regenerar. Teve direito a condicional por bom comportamento. Aos 25 anos, recomeçou sua vida como um homem de Cristo, se unindo a igreja local, tentando realizar um ato bom de cada vez, em sua busca por redenção. Foi quando ele conheceu o padre Frederico da Catedral de Colima. O padre o guiou e o aconselhou, mostrando os caminhos para que Ramon se tornasse puro perante ao Salvador. Depois de alguns meses, Cortez foi convidado para fazer parte da Mão Direita de Deus, um grupo liderado pelo padre Ferdinando que cuida de “arrancar os tumores do mundo para o Senhor”. O padre o instruiu dizendo que apenas impedindo que outros cometam pecados como os de seu passado, ele lavaria as manchas negras de sua alma. Desde então, Ramon gasta suas noites caçando “tumores” e demônios, mandando os impuros e indignos para o inferno. E esta é uma dessas noites. E talvez a última. De acordo com o padre, as outras dezessete pessoas que sentiram a ira divina pelas mãos do jovem foram quase o suficiente para sua purificação. Mais uma e ele teria seu lugar guardado no céu. Mais uma. Mais. Uma. Essas são as palavras que ecoam na cabeça de Ramon desde que entrou na casa. A janela que usou dava no quarto de um dos filhos de Banderas. Ele tenta seguir e abrir a porta com muito cuidado para não acordar o menino, que dormia inquieto em sua cama. Ramon segue pelo corredor, procurando sua vítima. Ele vê mais quatro portas, três fechadas e uma entreaberta. Ele se aproxima dessa ultima para examinar...
Ramon observa da pequena abertura entre a porta e a parede um casal, deitados na cama, em sono profundo. O homem era Hector. Logo, Cortez saca sua pistola e instala o silenciador... Teria que ser rápido, e infelizmente, teria de matar a mulher também... Ou talvez nem tão infelizmente... Afinal, se ela se relaciona com um monstro adúltero e assassino como Banderas, ela é outra maculada. Ele abre a porta com cuidado, anda alguns metros para frente e então aponta sua arma para a cabeça do homem. Antes de puxar o gatilho, ele escuta uma voz atrás de si:
- Papai, eu tive um pesade... – Diz o jovem filho de Hector, antes de ser interrompido pelo susto em ver um desconhecido no quarto de seus pais, apontando uma arma para eles. Instintivamente, Cortez aponta sua arma para trás, no intuito de identificar e eliminar a nova figura. O menino grita. Os pais acordam, se levantando rapidamente, assustados. Ramon aponta sua arma novamente para Hector e dispara, acertando-o no ombro. Banderas cai no chão agonizando. A mulher começa a chorar e gritar, junto ao seu filho que corre da porta para a cama para abraçar a mãe. O assassino mantém o olhar focado no homem baleado no chão, e então dispara mais duas vezes, contra a barriga. Banderas se debate no chão em agonia.
- Pare, por favor! Nós temos dinheiro, podemos te dar muito, por favor, não mate meu marido! – grita a esposa de Hector, completamente desesperada.
- Dinheiro não vai apagar os pecados do seu marido. E depois dele é sua vez. – Responde o assassino, tremendo, num misto de fúria, medo e excitação.
Ramon olha uma ultima vez para sua vítima, e mira na cabeça. Quando vai atirar, o menino pula dos braços da mãe e corre em sua direção.
- NÃO MACHUQUE O MEU PAPAI! – Grita o menino enquanto acerta uma tremenda cabeçada no peito de Cortez, que perde o fôlego e o equilíbrio, tendo que se apoiar na parede para não cair.
- Moleque idiota! – esbraveja Ramon tentando se recuperar. O menino se prende ao seu braço, tentando fazê-lo soltar a arma.
A mulher aproveita a distração e tenta abrir a gaveta do criado mudo. A arma de Hector... A única chance. Ela encontra o Revolver .38, mas não tem tempo de usá-lo. Cortez consegue se livrar do menino. Assim que ela tira a arma da gaveta, é alvejada com três tiros nas costas.
- VIIIIIIILLLLLMAAAAAAAAAAAAAAAA! – Grita Hector. Antes que pudesse tentar levantar para ver se a esposa ainda respirava, ele recebe uma bala na cabeça. Agora sobrava apenas o menino, que estava em choque. Cortez ainda cogita atirar contra a criança, mas não tem a coragem. É só uma criança. Ele dá uma coronhada no garoto, que cai no chão desmaiado. Missão cumprida. Agora só tinha que dar um jeito de sair de lá. Ele sai rapidamente pela mesma janela que entrou e tenta correr para encontrar uma saída, quando é avistado pelos dois vigias que se aproximavam da casa.
- Droga... – pragueja o assassino... Primeira vez que tinha sido visto desde que tinha começado os “trabalhos”. Ele corre incansavelmente, enquanto é perseguido pelos vigias. Estava ferrado, os guardas com certeza conheciam o lugar melhor que ele, e iam encurralá-lo logo. Felizmente, um dos guardas, o mais gordo, logo perde o fôlego e desacelera, sobrando apenas o outro.
- Chavo, liga pra a polícia, eu cuido desse cara! – diz Eddie enquanto mantém a perseguição. Correr na chuva é bem difícil. A pista escorregadia exige muito cuidado. Os dois homens permanecem correndo por mais duas quadras, e chegam a trocar alguns tiros e escorregar algumas vezes, até que Ramon é encurralado em um beco. “Hora de brilhar”, pensa o jovem vigia.
- Acabou palhaço! Mãos na cabeça agora! – Diz o vigia, apontando sua arma para Ramon certa satisfação. Nunca tinha dito ou feito algo do gênero antes.
- Nada disso... Eu não vou ser preso... Não outra vez, não agora que eu estou redimido! – Diz o assassino disparando mais algumas vezes contra Eddie, que corre em busca de cobertura. Um dos tiros atravessa a perna esquerda do vigia. Eddie senta atrás de um muro baixo e observa o ferimento... Sangrava horrores e tava bem feio... Não ia dar pra correr. Mas ele não podia deixar o bandido fugir, tinha que acabar com isso agora. Ele aperta sua arma e sair da cobertura, tentando acertar Cortez, que também dispara contra ele. Os tiros de Eduardo acertam uma das pernas de Ramon... Os tiros de Ramon acertam o peito de Eddie, que cai no chão, largando sua arma. Cortez tenta correr, mas sua perna não deixa. Ele se arrasta pelo chão para fora do beco, procurando outro caminho. Quando passa pelo vigia, ele tem sua perna agarrada.
- Você não vai embora! – grita Eddie, cuspindo sangue.
- Você não vai impedir um campeão de Cristo de ter sua liberdade e redenção! – revida Ramon tentando se soltar.
- Eu sou judeu, palhaço! Campeão de Cristo é o caralho! Agora fica parado aí antes que e... – E essas são as ultimas palavras de Eduardo Perez, que é acertado com um tiro certeiro que entra pelo seu olho direito, varando sua cabeça.
Livre finalmente, pensa Ramon, até escutar o barulho das sirenes. Mais policiais, ele não estava em condições de correr... Sem condições de fugir... Ele pensa na prisão, no inferno que ela tinha sido... no inferno que ela voltaria a ser... Com certeza não aguentaria dessa vez. Precisava de um milagre, e de um bem rápido.  E ele ocorre. Um carro freia bem a frente de Cortez. Um aliado? Um agente da Mão talvez? A porta traseira se abre, mas ninguém sai. Ele entende o recado e se arrasta pra dentro  fundo... A dor é excruciante... Tinha perdido sangue demais... Ele começa a perder a consciência... Mas nada mais importava a essa altura. Estava livre... Estava redimido.

Ramon acorda algumas horas depois, ainda dentro do carro em movimento. Ao seu lado, dorme uma jovem moça, de aparentes 17 anos. O assassino tenta enxergar o motorista, mas a falta de iluminação encobre seu rosto.
- Quem é você? – Pergunta Cortez ao motorista, coçando os olhos.
- De nada por ter salvado a sua bunda, não foi nada. – Responde o motorista, com sarcasmo.
- Desculpe por isso... Obrigado irmão. – Diz Ramon, claramente desconfortável – Foi o padre Ferdinando que te mandou pra me ajudar?
- Não, não... Eu vim por conta própria. – diz o motorista– Pensei que pudesse te impedir de fazer alguma besteira...
- O alvo foi mandado pro inferno... Eu estou redimido... O padre vai ficar muito feliz em saber disso.
- Nem vai. Duvido ele ficar feliz com qualquer coisa hoje. Na verdade duvido ele ficar feliz com qualquer coisa amanhã também. Na boa, ele nunca mais vai ficar feliz com nada...
- Por que diz isso irmão? Aconteceu alguma coisa com ele? – Pergunta Cortez, confuso.
- Eu aconteci com ele. E agora ele está morto. – Ri o motorista. – E agora a Lily vai acontecer com você... Nada pessoal Ramon... Só que a menina tá com fome e você é um verme que não fará falta.
- Quem diabos é você? – Diz o jovem assassino sem sorte, procurando sua arma. Não tem tempo de acha-la. Uma mão fria e pequena segura em seu ombro e o aperta... Ele sente um calafrio anormal na espinha.
Ramon olha aterrorizado para a menina ao seu lado. Ela abre os olhos e a boca, exibindo os dois grandes orbes negros e dois pares de caninos gigantescos. Ele ainda tenta escapar pela porta do carro, mas estava travada.  A garota rapidamente leva as presas ao pescoço de Cortez, destroçando-o... Ele grita por socorro, urra de dor. Jason Rhodes aumenta o som do carro para abafar o barulho. Lilian Mulligan continua estraçalhar o assassino, mordendo, puxando, mastigando... Como um leão faminto devorando sua presa. Ele tentar lutar, golpeando-a com socos, chutes, mas a jovem vampira não recua. Ramon Cortez sente sua carne sendo rasgada pedaço a pedaço... Primeiro a de seu pescoço, depois de seu rosto, depois de seu peito... Até que não sente mais nada. Em poucos minutos nada mais sobra de Ramon Cortez além de um monte de carne amorfo e vermelho.
Jason abaixa o som e para o carro. Apenas o som da chuva e o rosnado bestial de Lily podem ser ouvidos. Ele olha apara trás e observa a garota ensanguentada e furiosa no banco traseiro. Seu pequeno monstrinho de estimação. Infelizmente, o verme não proveu sangue o suficiente para Despertá-la... Mas isso não chegou a ser uma surpresa. Rhodes leva a mão ao rosto de Lily e limpa um pouco do sangue em sua face... A expressão assassina da garota vai embora, dando lugar a outra completamente diferente, inocente, calma... Pura. Ela aproxima seu rosto do dele. Jason sorri e então sussurra em seus ouvidos.
- Volte a dormir pequena Lily... – Essas palavras ecoam na cabeça da menina como se chegassem ao fundo se sua alma. Instantaneamente, ela cai em um sono profundo.
 - Falarei com você assim que estiver completamente Desperta. – Diz Jason Rhodes aninhando Lily no banco de trás, antes de dar a partida no carro e continuar sua viagem em direção à Michoacán... Um assunto ainda teria que ser resolvido antes do próximo nascer do sol...

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Bloody Rhodes - Conto 7 - "Rastros"

     - É ele mesmo? – Pergunta o detetive James Perez, enquanto os outros policiais retiram o corpo de debaixo da terra.
     - Não dá pra saber ainda... Está muito sujo, e não sobrou muita coisa... Da cabeça dele. – responde um dos cadetes, levando a mão à boca para segurar o vômito. A cena era realmente perturbadora. O cadáver já estava bem destruído. Vestia uma calça preta e uma camisa bege, aparentemente um uniforme... Uniforme de policial. Faltavam pedaços da parte frontal do rosto, arrancado com o que deve ter sido uma pancada bem violenta. O sangue misturado com a terra cobria o ferimento o tornando ainda mais grotesco. Também havia ferimentos na perna esquerda e na barriga. Seja lá quem o matou ou como o matou, com certeza estava de mau humor.
     Os policiais retiram o corpo do buraco completamente, com muito esforço, e o colocam no saco, para levá-lo ao necrotério para a necropsia. O detetive se aproxima do defunto antes que seus colegas fechem o zíper, para dar uma olhada no corpo mais de perto. O cheiro era insuportável, James quase passa mal. Trabalhava como policial fazem dez anos,  mas ainda não estava acostumado com esse tipo de ocorrência... E nunca tinha visto um cadáver tão brutalmente destruído. Ele leva as mãos ao que sobrou das roupas do defunto e encontra escondida entre sangue e terra, perto do peito do morto, uma estrela dourada. Sem muito esforço ele limpa o objeto e logo vê as letras esculpidas... “Xerife”.
     - É o Mulligan. – suspira o detetive. – E isso são buracos de bala. Coitado.
     - Coitado do chefe... Era um homem bom... Não merecia isso. – diz um dos cadetes.
     - Isso não foi uma execução qualquer... – James fecha o zíper do saco preto e os outros homens levam o corpo pro carro. Apenas o cadete Joe Morris fica na cena do crime – Enterraram ele no quintal da própria casa... Quem fez isso queria que encontrássemos o corpo... Isso é uma mensagem, um aviso.
     - O que fazemos agora James? – pergunta o cadete Joe, com uma mistura de tristeza e raiva.
     - Esperamos os caras da necropsia dizerem direitinho o que matou o Xerife, enquanto nós olhamos os relatórios do Mulligan na delegacia, pra checar se ele tinha inimigos, e tentamos rastrear o assassino. – James põe a mão no bolso e puxa um cigarro. – Vá no carro e ligue pro Henry...veja se ele já achou a viatura do Mulligan.
     - Sim chefe. – O cadete se apressa, correndo em direção ao carro.
     O detetive olha para o céu e dá a primeira tragada. Isso estava ficando complicado. Era um caso já complicado de desaparecimento, mas ele não estava levando tão a sério até ver o corpo. Mulligan sempre foi um gordo festeiro, a suspeita de Perez é que ele teria ido à cidade vizinha se divertir no Pork’s ou algo do gênero. Não era a primeira vez que o chefe saia sem avisar, mas essa era a primeira vez que ele sumia por tanto tempo. Uma semana parecia demais. As buscas tinham começado há dois dias, mas infelizmente a primeira pista só apareceu hoje... E infelizmente foi a pior possível. Apenas uma pergunta martelava em sua cabeça...quem fez isso?
     - Ei James! – grita um policial de dentro da casa! – Tem algumas coisas aqui que você precisa ver.
     James adentra a residência de Mulligan apressado, faminto por respostas. Ele encontra um dos policiais na cozinha da casa, em frente a um buraco na parede. Próximo ao buraco, diversas manchas vermelho escuro. Sangue seco. O policial coloca uma pinça no buraco e puxa um pedaço de metal amassado.
     - Calibre .44. – diz o perito.
     - Hummm...só encontrou essa bala?
     - Sim detetive... Apenas esse disparo foi realizado dentro da casa.
     - O corpo enterrado lá fora era mesmo o do xerife, mas ele levou muito mais tiros do que isso, e pelos ferimentos no corpo, deveríamos ver mais sangue por aqui. Encontraram mais manchas em algum lugar da casa?
     - Encontramos algumas manchas de sangue no carpete da sala de estar, mas muito pouco... Aquele parece ter sido lavado.
     - Recolham essas amostras pra fazer o exame de DNA, temos que ter certeza de que esse sangue é mesmo dele. E digitais? Encontrou alguma?
     - Você é novo por aqui não é James? – retruca o perito com certo tom de sarcasmo. - Estamos em Plainville detetive, não em New York. Não temos laboratórios pra isso, não temos material pra isso... Possivelmente o cara que matou o Mulligan já deu no pé e nós não temos testemunhas ou suspeitos. Esse caso acabou.
     - Não temos suspeitos ainda. Mulligan com certeza tinha algum inimigo... Um criminoso ordinário não ia fazer aquilo com o corpo a troco de nada. Aquilo foi vingança. Só precisamos descobrir quem foi. Estamos em Plainville, não em New York... A cidade é menor e todo mundo se conhece... Não será tão difícil achar algum suspeito. Esse caso só está começando. – responde James, com raiva na voz. O detetive anda então em direção a sala pra ver as outras manchas de sangue. Ele observa o aposento pequeno, dando atenção principalmente ao carpete, procurando as manchas rubras. Ele leva os olhos a cada canto do local, até encontrar uma pequena estante no fundo, perto das escadas. Ele se aproxima da estante, e vê alguns papéis velhos, empilhados junto a alguns livros. Ele examina a pilha por alguns minutos procurando alguma coisa útil, encontrando alguns documentos, notas fiscais, livros escolares... E um porta retratos. A foto estava mofada, empoeirada já tinha praticamente perdido as cores. Deveria estar lá há muitos anos sem ser tocada...na imagem,  Mulligan, aparentemente mais jovem, abraçado com o que parecia ser uma senhora, com uma criança nos braços.Um estalo se dá na cabeça de James Perez.
     - Kent! Por acaso Mulligan tinha família?! – Pergunta o detetive correndo em direção a cozinha com a foto em mãos.
     - Ele tinha uma mulher que morreu alguns anos atrás... E uma filh... – James não deixa Matt acabar, e sai correndo disparado em direção às escadas. Por que ninguém tinha falado isso pra ele antes? Uma pista, uma informante... Alguém pra falar sobre os inimigos do Xerife... E se a garota ainda estiver viva, uma testemunha em potencial. Ele se apressa pelas escadas, correndo em direção aos quartos, quando avista uma porta entreaberta. Ele empurra a porta  com força e observa o cômodo.Era um quarto pequeno, com um papel de parede de flores rosas, muito desgastado, com diversas manchas e rasgos.Tinha que ser o quarto da menina.Os lençóis da cama completamente abarrotados e desarrumados, com gotas vermelhas e escuras em diversos pontos, além de alguns pedaços de porcelana, também manchados.Deveria ser sangue.
Perez vasculha o quarto com seus olhos azuis, procurando mais pistas, qualquer coisa que o permita entender o que diabos tinha acontecido ali. Ele encontra ataduras debaixo da cama, algumas limpas e outras usadas, e uma blusa rasgada. Nada disso fazia sentido. Ou talvez fizesse. O Xerife tinha um inimigo, que o atacou fora daqui. Mulligan voltou pra casa baleado, e sua filha tentou fazer o socorro com as ataduras, mas então a casa foi invadida e Mulligan morto na cozinha, e a menina possivelmente seqüestrada. Explicaria muita coisa, mas deixaria pontas soltas demais. Pelo menos era um começo. Talvez eles devessem procurar manchas no jardim, sinais de luta pelos outros cômodos...
- James, temos um problema. – Diz o cadete Joe adentrando o quarto.
- o que foi Joey?
- Tem mais dois corpos naquele buraco. Dois garotos.
O detetive James Perez respira fundo... Isso tudo estava ficando muito mais complicado a cada segundo que passava...

*****

     - A causa da morte foi esse projétil que perfurou o crânio. Calibre .44.Estava alojado na parte posterior da cabeça. – Diz o detetive Matt Oak, observando o corpo aberto de Mulligan na mesa de necropsia.
     - Talvez vinda da mesma arma que varou o corpo dele na cozinha. – diz o detetive Perez.
     - Mas não do mesmo tipo... As balas que os legistas encontraram no corpo são do tipo Ponta Oca. Elas meio que explodem quando entram no corpo, aumentando o tamanho do ferimento, mas não são capazes de varar uma pessoa. A bala da cozinha não era desse tipo, mas pelas marcas, foi disparada pela mesma arma.
     - Quantas balas os legistas encontraram no corpo?
     - Sete. Três no tronco, três na perna esquerda e uma na cabeça.
     - Então aquele tiro na cozinha não foi no Mulligan...
     - Foi na filha dele. – Conclui Matt.
     - Ou em algum dos garotos.
     - Não exatamente... Os legistas ainda estão analisando os corpos dos meninos, mas já me adiantaram que não foram baleados. Na verdade, não há ferimentos aparentes.
     - Pelas barbas do meu avô judeu... Quanto mais respostas temos, mais perguntas arranjamos. – suspira James.
     - Pela posição dos buracos, o xerife estava olhando pra o atirador enquanto era executado. Os tiros foram feitos de frente e a uma curta distância.
     - Mas não foi morto perto da casa, pois não achamos manchas de sangue correspondentes a ferimentos dessa gravidade nas proximidades de onde achamos o corpo.
     - Então... Ou o assassino limpou a cena do crime... – Supõe o detetive Oak.
     - Inviável, ele deixou um rastro descarado pela casa, não estava se importando com isso.
     - Então Mulligan já estava morto quando chegou a casa para ser enterrado, e então o assassino seqüestrou a filha dele.
     - Estamos investigando a cena do crime errada. – diz Perez.
     - Tem mais... Ele está com diversos hematomas e cortes no tronco e no rosto, além de alguns dentes quebrados. Mas pelo que os legistas viram... Foram feitos depois que ele morreu.
     - Então alguém ainda o encheu de pancada depois de morto.
     - Precisamente, mas ainda não sabemos com o quê.
     - O Joey e os outros já analisaram os diários do Mulligan pra ver se ele prendou ou incomodou alguém barra pesada nos últimos tempos?
     - Ainda estão olhando... Mas até agora nada. Plainville é uma cidade tranqüila, e os crimes aqui costumam ser coisas bem mais leves... Eu acho que isso foi encrenca que ele arranjou em alguma cidade vizinha.
     - Talvez Leawood?Ele poderia ter algum inimigo no bar do Pork’s...
     - Não sei... Temos que rastrear alguns amigos dele e ver se alguém sabe de alguma coisa. Fale com os outros policiais pra ver se alguém o conhecia melhor...acho que o Henry pode saber de alguma coisa, eles já foram ao Pork’s algumas vezes.
     - Já ligou pra ele pra saber se ele achou o carro?
     Os detetives escutam o trinco da porta se mexer.
     - Ei seus porras, venham cá nessa porra desse caralho que encontramos o carro do xerife presunto. – diz o oficial Henry entrando na sala de necropsia. – E se apressem que eu ainda quero dormir nessa merda de noite. – resmunga o oficial.
     - Falando no diabo. – ri James.
     Matt e James saem da sala seguindo Henry, se dirigindo a sala de vídeo.
     - O carro não estava com nenhuma marca de luta ou buraco de bala, e qualquer sangue naquelas proximidades ou nele foi lavado pelas chuvas dos últimos dias.
     - Onde você o encontrou Henry? – Pergunta Matt.
     - Na estrada de terra lá na puta que pariu, perto de Leawood. – Responde Henry.
     - Achou alguma coisa útil? – Indaga Perez, curioso.
     - A câmera da frente do carro do gordão tava ligada... Os caras estão tentando passar o vídeo aqui na sala pra ver se vemos alguma coisa.  Mas eles já me adiantaram que ela tá numa qualidade de merda... O equipamento do Mulligan era bem velho e o vídeo deve tá com uma definição de bosta.
     - Oficial Henry, vamos passar a fita agora. – Diz um policial, colocando a cabeça pra fora da sala de vídeo.
     Os três entram na sala e se sentam, esperado o play no velho vídeo cassette no canto da sala, na qual estavam mais quatro policiais. O vídeo começa, mostrando a frente do carro pela estrada durante a chuva.As imagens são turvas e confusas, pois a qualidade do vídeo era muito baixa e a chuva ajudava a piorar.Eles assistem a fita por alguns minutos, adiantando sempre que possível, na esperança de encontrar algo útil.Eles vêem Mulligan saindo do carro  e entrando na própria casa, e retornando depois de meia hora.Eles vêem cerca de uma hora de gravação mostrando apenas estradas e chuva, até que se deparam com uma abordagem.A viatura tinha parado um Ford F-1000.Mulligan sai do carro, e desliga o limpador de vidros, que deixa a imagem completamente turva, devido a água caindo no pára-brisas . Daí pra frente, os policiais só escutam frases desconexas e palavras soltas na gravação... Poucas eles conseguem ouvir e compreender, devido ao barulho da chuva forte no capô. ”Saiam do carro... não me forcem... tirar vocês daí”, “Palhaço” “Deixa... paz” “Para!” e um tiro. Silêncio. São três vozes diferentes, e a única certeza é que uma delas é de Mulligan. Os policiais permanecem pensativos tentando entender a cena. Quando escutam um grito... Da voz aparentava ser a de Mulligan. Depois mais alguns gritos, dessa vez de uma voz desconhecida, diferente das outras duas que apareceram antes. “Não... eu juro”, “Rhodes”, “Por favor”, “Recado... Filh...” e mais tiros. Sete ao todo. E mais silêncio.
Os policiais assistem ao vídeo, atônitos. Escutar um assassinato é algo pelo qual eles nunca tinham passado antes. Mas o vídeo ainda não acabou... Eles vêem um borrão humano carregando alguma coisa acima dos ombros. Pelo tamanho e o vermelho,essa coisa deveria ser o corpo ensangüentado de Mulligan. O vulto joga o possível corpo pela caçamba do F-100 e se dirige a sua porta, entra e dá a partida no carro, saindo do campo de visão da câmera. Henry pausa o vídeo. James se levanta.
- Bem pessoal, precisamos de um especialista em vídeo pra deixar a imagem mais limpa pra a gente, pra conseguir rostos e a placa. Também precisamos cuidar do som, talvez isso nos ajude a rastrear o assassino, ou pelo menos entender as circunstâncias do assassinato. Temos uma possível placa de carro e um nome pro assassino. Rhodes. – O detetive Perez se dirige a um velho quadro branco no outro lado da sala, e começa a apagar os nomes aleatórios escritos nele. – Henry, preciso que você analise o lugar onde vocês encontraram a viatura mais uma vez, e depois que vá no Pork’s ver se descobre algo... Matt, você vai acompanhar a autópsia dos garotos encontrados junto do Mulligan e me dizer os resultados o mais cedo possível, e eu vou retornar a casa pra ver se encontro mais alguma coisa. Falem pro Joe procurar pelo nome Rhodes nos arquivos do xerife. Acho que temos uma pista quente agora.
- Quem morreu e te elegeu o chefe Perez? – Pergunta Henry, com sarcasmo.
- O Mulligan... – responde o detetive James ríspido - Agora deixe de viadagem e vá fazer o que eu pedi... Demos uma semana de vantagem pro assassino, temos que recuperar o tempo perdido e encontrar o desgraçado. Temos muitas questões aqui, precisamos caçar algumas respostas. – James pega um pincel e anota no quadro:

 “Onde está a filha de Mulligan?”

“Quem eram os meninos na cova?”

“Onde está Rhodes?”

“Quem é Rhodes?”

Os oficiais se levantam e rapidamente vão saindo da sala para realizar suas tarefas. Apenas James Perez fica na sala, observando as questões que ele mesmo escreveu na lousa. Ele tinha o maior quebra cabeças da sua vida em mãos, o crime mais hediondo que já tinha visto... Um misto de medo e empolgação, seguido de uma melancolia começou a fluir pelo seu corpo... Ele sorri.
- É melhor correr “Rhodes”... Ninguém foge do detetive James Perez por muito tempo... Ninguém...

    
                    
     

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Bloody Rhodes - Conto 6 - "Lírio Sangrento"

- É você Satanás? - pergunta Jason Rhodes, de costas para seu algoz, enquanto seu rosto é lavado pela chuva.
- Sem brincadeiras desgraçado... - diz a atiradora, fitando o vampiro. Parecia furiosa. - Isso acaba hoje.
- E quando começou? - debocha Rhodes.
- Sem joguinhos comigo filho da puta! - ela responde, bufando.
- Você deveria ter ficado na sua cidade e vivendo a sua vida ao invés de perder tempo me seguindo. Poderia ter se machucado... Talvez morrido.
- As únicas balas que eu levei desde que te conheci vieram da sua arma, maldito! - grita a garota.
- Verdade, mas foram culpa sua. Por que você tem idéias idiotas, e alguém tinha que te ensinar uma lição. - fala Jason no mesmo tom de deboche - Confesso que me surpreendi quando você não gritou quando eu te acertei no Fanfare.Tiros na perna doem.
- Sou mais durona do que você pensa. – diz a garota tirando os cabelos castanhos e molhados da frente dos olhos.
- Durona eu não sei... Burra por outro lado... - o vampiro ri.
- CALA A BOCA!
- Não parecia tão durona quando eu atirei no seu ombro. Ele ainda dói?
- CALA A BOCA! – os olhos da garota se enchem de dor.
- Ui, ela ficou nervosa.
- CALA A BOCA! - grita a garota bufando e tremendo de tanta raiva... Jason começa a se virar.
- Para de perder meu tempo, tá legal? Nós sabemos que se você fosse atirar em mim você já teria feito isso.
- CALA A BOCA!
- Não, você cala a boca!Vai embora e para de torrar minha paciência... Meu dia foi bem cansativo.
- CALA A BOCA FILHO DA PUTA! EU VOU ESTOURAR SUA CABEÇA!
- Tá legal... Vai, atira! - gargalha Rhodes.
- CALA A MALDITA BOCA DESGRAÇADO!
- ATIRA!
- CALA A MALDITA BOCA!
- ATIRA LILY!ACABA LOGO COM ISSO!NÃO É O QUE VOCÊ QUER?ABRE UM ROMBO NA MINHA CABEÇA IGUAL AO QUE EU FIZ NA DO SEU PAI!
Ela respira fundo e atira contra  Rhodes...acerta no pescoço.A porta do carro se tinge de vermelho, mas logo é lavada pela água da chuva.Jason se ajoelha e leva a mão no pescoço para diminuir o sangramento.O sorriso em seu rosto desfigurado vai embora e dá lugar a uma expressão confusão.
- Porra!Você atirou mesmo!Não acredi... - O vampiro não chega a terminar a frase. Lily descarrega o sua Glock 9.mm contra Rhodes, que tenta se esquivar como pode se jogando para o lado, rolando na lama, mas ainda leva vários disparos no tronco e na perna direita.Com certeza ele teria sido acertado por todos se ela não tremesse tanto.
- VAI, CONTINUA FALANDO!VOU TE FAZER SANGRAR PELO QUE FEZ COMIGO! – grita a atiradora, apagando a menina insegura que segurava a mesma arma segundos atrás...
Lily recarrega a arma. Jason aproveita esse tempo e se arrasta para trás do carro para conseguir alguma cobertura.... E então puxa sua .44.
Ela corre em direção ao carro atirando, tentando acertar Jason no processo. Rhodes ergue sua Anaconda e dispara duas vezes contra Lily, uma contra o peito e outra contra o ombro. Certeiros. A menina deixa a arma cair e começa a se contorcer de dor na lama. Jason anda até ela e observa, enquanto ela se debate no chão e grita. O sangue escorre velozmente de seus ferimentos. Ele então a levanta e a joga contra a porta do carro, tentando apoiá-la para mantê-la em pé. Ela tenta resistir, chega a acertar um soco no estômago de Jason, que mal o sente.Ela continua a gritar e bufar.
- Eu realmente não te entendo. Eu faço um serviço pra você, de graça, removo a pessoa mais detestável da sua vida do seu caminho, te digo pra viver e é assim que você me agradece?Tentando meter uma bala na minha bunda? - grita Rhodes encarando Lily com seu rosto ferido. - Por quê, Lily?
- VAI PRO INFERNO!
- Fala logo...você não tem a noite toda...
Ela não responde, continua apenas gemendo de dor, quase engasgando com o próprio sangue.
- Responde! - Pergunta Jason, pela primeira vez em muitos anos... Transtornado.Seu olho negro se encontra com os olhas castanhos da menina...O olhar de fera furiosa de Lily se esvai, dando lugar a um olhar vazio.Ela desvia os olhos.
- Voc-cê não entende... - responde Lilian, com tristeza na voz. - Eu... Eu quero morrer.
- Isso eu já entendi porra... A pergunta é, por que você quer morrer? – pergunta Jason, intrigado.
- Eu já morri... - Jason permanece em silêncio, fitando os olhos da garota esperando que ela fale mais... Estranhamente, ela não parece desconfortável com o olho que o falta. Ela tosse um pouco de sangue e continua - eu morri por dentro faz muitos anos... - ela para um pouco e respira fundo -  o suicídio de mamãe, os gritos, as humilhações, as surras...os...estupros...tudo isso me matou, um pouco de cada vez, durante os anos...o que sobrou de mim hoje é apenas uma casca vazia...inútil. - ela para mais um pouco para respirar... A dor ainda é intensa, e as gotas geladas de água nos ferimentos a pioram - quando você me apareceu, dizendo que mataria aquele porco eu pensei que poderia seguir com minha vida... Seguir em frente... Mas a melancolia não sumiu a dor não sumiu... Quando você voltou e impediu meu suicídio, pensei que era um sinal para continuar vivendo, que era mais uma chance... Achei ter sentido uma chama de vida queimar aqui dentro por alguns dias... Mas a melancolia não sumiu a dor não sumiu...
- Então por que você não se matou depois que eu fui embora?- Pergunta Rhodes, cínico.
- Eu tentei... - ela mostra um dos pulsos, com marcas de cortes - mas não consegui... Tentei várias vezes, mas não consegui cortar fundo o suficiente, puxar o gatilho ou colocar a corda no pescoço... Eu não tenho razões pra viver... Não tenho gosto pela vida... Mas não consigo me matar... Patético não é? – ela desvia o olhar por alguns instantes.
- Muito patético... Mas isso ainda não explica por que você veio atrás de mim.
Silêncio. Para de chover.
- Eu quero que você me mate... Eu não consigo dar um fim nisso... Eu sei que você consegue. - Lily direciona o olhar para a Colt Anaconda por um instante, e então volta a fitar os olhos de Rhodes. O vampiro faz uma cara de desaprovação e suspira...
- Não. Você está mentindo... Se quisesse que eu te matasse, não estaria me contando sua história patética, estaria me provocando e cuspindo na minha cara até eu terminar o serviço... Por algum motivo... Você quer que eu sinta pena de você, quer que eu entenda você. POR QUÊ?!
- Por que você se importou. - Ela sorri. Seu olhar muda novamente... O vazio dá lugar a esperança.- Por que você foi a única pessoa que me escutou desde que minha vida desmoronou... Foi o único que fez alguma coisa por mim... O único que se preocupou comigo... - ela abaixa o tom de voz e sussurra - você é tudo que eu tenho.
    Jason para um instante e olha para o céu. "Completamente louca" Pensa Jason.
 - Então foi isso?Toda essa perseguição, essa conversa depressiva, os tiros que eu levei os furos no meu carro... É a sua maneira de se manter próxima de mim por que na sua mente juvenil e insana, eu sou cara que vai ajeitar a sua vida? Acha que eu sou o seu maldito príncipe encantado? - pergunta Rhodes com um cinismo misturado com raiva.
- É. - Responde Lily com uma naturalidade assustadora. – Eu só me sinto viva com você por perto... Eu só sinto algo com você por perto.
- E o que você espera qu... - Rhodes não completa a frase... A garota o interrompe novamente, mas dessa vez não com um tiro, mas com um beijo. Jason sente a mão fria de Lily deslizando por seu rosto rasgado enquanto seus lábios se tocam. Seu gosto  doce aos poucos vai se tornando metálico... Como ferro. O sangue escorre pelo canto da boca da garota... Que aos poucos para de se mexer. Jason sente o corpo de Lily pesar sobre o seu. Sem respiração... Estava morta. Ele observa o cadáver em seus braços por alguns minutos. Rhodes já viu muitas coisas assustadoras e bizarras em sua noite eterna... Já presenciou praticamente todo tipo de atrocidade, e já praticou quase todas elas também, mais de uma vez... Mas nada do que viu ou fez distorceu sua sanidade como a vida fez com aquela menina. Lily era como um quebra-cabeças amassado e sujo de sangue... Você pode juntar as peças e tentar montar... Mas muitas das peças nunca se encaixarão, e você nunca será capaz de ver com clareza a figura que ele forma. Homicida, suicida, obsessiva... E ao mesmo tempo estática, submissa e depressiva... Fascinante. Sua loucura a transformou na donzela em perigo e vilão cruel ao mesmo tempo... Refém de sua própria mente demente... Um monstro insano, criado pela morte da mãe e libertado pela morte do pai. De uma maneira estranha, Jason sente que parte disso é culpa sua. Ele libertou algo único, torto, assustador e mortal. Tinha um tesouro em mãos... Um tesouro ele tinha perdido para a morte... Ou talvez não. O vampiro sorri. Jason reclina o corpo morto da jovem, e então leva as presas ao seu pescoço... Seu olho se torna um globo completamente negro e opaco... Ele silva e então a morde, rasgando a carne com suas presas. O sangue escorre pelo ferimento, inicialmente escarlate, e vai aos poucos se tingindo e negro... O corpo treme um pouco. Lilian ergue as pálpebras, arregalando os orbes negros que agora eram seus olhos e dá um grito animalesco, exibindo os caninos enormes...

“Bem vinda à noite eterna, meu pequeno lírio sangrento...”

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Bloody Rhodes - Conto 5 - "Cruzes"



Catedral Basílica Menor de Colima, México, dez da noite... Nuvens cobrem o céu anunciando uma tempestade que se aproxima. Fim da missa. Os fiéis saem apressados do templo na esperança de alcançarem seus lares antes que a chuva chegue. O lugar fica vazio. O silêncio reinaria supremo no interior do templo se não fosse a conversa sussurrada, quase inaudível vinda do confessionário.
- Padre... Eu fiz o que o senhor pediu. A justiça do Senhor foi feita. - disse Ramón Cortez, com pesar na voz.
- Muito bem filho, muito bem... Com certeza a alma da irmã Piedade descansará em paz agora. - respondeu o padre calmamente.
- Que Deus a tenha padre...
- Que Deus a tenha, meu filho - o padre tosse e se volta para Cortez novamente. - Qual destino deste aos restos do demônio Ramón?
- Queimei e joguei as cinzas ao vento padre... sem vestígios.
- Muito bem filho... Muito bem. 
- Padre, Deus me perdoará pelos meus outros pecados agora que me tornei um instrumento de suas vontades? - perguntou Cortez apreensivo.
- Sim Ramón, o Senhor o perdoará de seus pecados anteriores, desde que continue a seguir suas ordens. Mas ainda há muito a ser feito para apagar seus erros do passado meu jovem... - respondeu o padre com uma calma desconcertante.
- S-Sim padre. - gaguejou Ramón.
Um envelope desliza por baixo da porta do confessionário até os pés de Ramón. A garganta do jovem seca.
- Essa é sua próxima tarefa criança... É a vontade do Senhor.
- Quem é dessa vez padre? - falou Ramón com uma voz baixa, temeroso.
- O nome dele é Hector Banderas... Mais um emissário de Satanás... Adúltero, vaidoso, ganancioso... E assassino. Hector tem envenenado os sopões da cidade, causando a morte de diversos mendigos e de outros necessitados... Essa atrocidade tem que acabar já.
- Estará no Inferno ao fim da noite padre - disse Ramón - a justiça do Senhor será feita.
Cortez levanta-se e sai do confessionário. O padre escuta os pesados portões da catedral se abrindo e se fechando logo em seguida. Alguns segundos de quietude absoluta se passam, enquanto o sacerdote se perde em seus próprios pensamentos... Ele escuta trovões... A chuva chegou. A missão foi dada. Agora é apenas esperar. Ele ergue o velho corpo para sair do confessionário, mas antes que pudesse alcançar a porta, uma voz vinda do outro lado do confessionário rasga o silêncio...
- Padre, eu pequei. - diz a voz.
- Conte-me seus pecados filho...e eu hei de absolvê-lo em nome do Senhor. - diz o sacerdote, tentando mascarar o susto.
- Padre... Eu matei - relata a voz, sem nenhuma emoção.
- Filho, isso é um crime muito grave!E por que você fez isso filho?  - perguntou o padre, aflito...a voz lhe era estranhamente familiar.
- Ele tentou me matar padre...Matar a mim e a um amigo meu.
- Mas filho, você não deveria tê-lo matado... Essa justiça não cabe a ti, e sim ao Senhor.
- Não foi só ele que eu matei padre.
O sacerdote engole seco. Estava lidando com uma alma mais negra do que podia imaginar. Ele tenta observar o rosto do homem através da tela, sem sucesso. As luzes da catedral estavam apagadas.
- Quantos mais filho?
- Perdi a conta depois do milésimo. - ri o homem.O padre se mantém em silêncio.
- O nome Oscar Gutierréz o é familiar padre Frederico? Ou devo te chamar pelo nome verdadeiro Darrel? - indaga o homem.
O nome Oscar atinge o padre como uma marretada no peito. Gutierréz era um de seus agentes... Havia sumido durante um dos trabalhos semanas atrás...
- Sem respostas? Tudo bem... Que tal Xerife Jack Mulligan?Ah quase me esqueço, você mascara muito bem o seu sotaque inglês Darrel...confesso que ainda tive que escutar sua voz duas vezes para reconhecer...
O padre se desespera... Ele está aqui... E não deve estar muito feliz... Ele tenta abrir a porta do confessionário. Bloqueada.
- Opa...não corra ainda Darrel...ainda não terminamos de conversar...e então...qual a sua jogada aqui no México? Drogas? Prostitutas? Assassinos de aluguel? Tudo ao mesmo tempo?
- Vá pro Inferno.
- Já fui e voltei... Não é um lugar tão legal quanto eu pensei. - debocha Jason - aliás, eu escutei sua conversa com o garoto Cortez...usar fiéis de assassinos para sumir com os figurões da cidade para facilitar o seu domínio e do Padrinho...muito esperto...eu deveria ter pensado nisso antes.Vi num jornal que um possível candidato a prefeito sumiu semana passada durante um passeio de carro...aposto que tem sua mão aí...
- Como chegou até mim Castille?  - pergunta o padre claramente transtornado.Jason ri. 
- George Knight... É o nome de um dos seus agentes nos Estados Unidos... Fui a casa dele primeiro... Cara durão. Ele demorou pra falar... Mas me contou sobre seus negócios aqui no México... Eli me arranjou a localização exata... Então, aqui estou.
- Maldição. - praguejou o padre.
- Você deveria ter mandado um Sem-Rosto falar com o porco do Mulligan ao invés de um agente humano... Como você fez com os assassinos de aluguel em Leawood...Erros como esse ainda vão te custar a vida Darrel...aliás...já custaram.
Jason Rhodes dispara três vezes contra o padre pela tela do confessionário. Os gritos de Darrel soam como música para seus ouvidos. Rhodes sai calmamente pela porta segurando uma espingarda calibre. 12 e anda alguns metros em direção ao centro da Catedral... E então grita:
- Sai daí Darrel....Isso com certeza não chegou nem a te ferir direito... - Silêncio. Jason dispara mais três vezes no confessionário, descarregando a arma.
Darrel sai do que sobrou do estande. Ao ficar de pé, o padre olha diretamente para Jason e urra como um animal furioso, enquanto seu corpo começa a se transformar.
- Forma Verdadeira? Isso não me impressiona. - ri Rhodes.
O corpo de Darrel cresce, seus músculos incham rasgando a pele, quatro chifres nascem no topo de sua cabeça... Seus caninos quadruplicam de tamanho e suas unhas se tornam garras. O demônio estava pronto.
Jason faz o primeiro movimento, jogando a arma descarregada no chão e empunhando sua Colt Anaconda...Darrel corre para alcançá-lo...ocorrem os primeiros disparos contra o padre, enquanto Rhodes corre em direção ao altar...As balas perfuram o peito do monstro, mas não o fazem recuar.A gigantesca mão do padre alcança o pescoço de Jason e prende contra o chão, parando-o no meio do caminho.
- Grrraaaaarrghhhh – grunhe Darrel.
- Não consegue falar na Forma Verdadeira? Você é mais fraco do que eu pens... – o monstro pressiona o pescoço de Jason com força, rompendo o piso de madeira abaixo deles. – Ok-kay...nem tão fraco assim. – Darrel ataca com suas garras, tentando decepar a cabeça de Rhodes, que desvia parcialmente ao mover o pescoço para o outro lado... A carne seu lado esquerdo é dilacerada... Seu olho sai rolando pelo piso. Jason contra ataca com um tiro no cotovelo do padre, à queima roupa, seguido de mais um disparo contra o ombro, fazendo com que Darrel diminua a pressão feita contra seu pescoço, permitindo-o escapar. Jason corre para manter uma distância segura enquanto recarrega sua Colt... O padre o persegue. A cada aproximação Rhodes descarregava mais munição contra o inimigo, fazendo-o recuar, até que Darrel o encurrala contra o altar.
- Gwooorhgahhagaaaa!! – urra o monstro, envolto em seu próprio sangue vindo dos buracos de bala, pronto para dar um ultimo bote.
Quando a criatura avança, Jason põe a mão em eu casaco pega uma granada, e a joga contra o chão.
- Hora de ver a Luz do Senhor! – grita Rhodes, jogando a granada no chão. A Catedral se enche de um brilho ofuscante. Flashbang. O monstro recua e tateia as paredes tentando se localizar... E então sente uma pancada violenta no peito. Uma lâmina atravessa sua perna esquerda... Darrel se ajoelha, sem enxergar absolutamente nada, e soca o vento, na esperança de acertar alguma coisa... E é golpeado novamente, dessa vez na cabeça. Quando tenta se levantar, o monstro ainda cego é perfurado por algo no peito, talvez uma lança... Uma lança bem grande.
- Arrhhghhhhhrrrr!! – grita o padre, enquanto é empalado vivo. Ele sente seu corpo ser erguido pela lança. Sua visão começa a voltar. Ele enxerga Jason Rhodes em sua Forma Verdadeira segurando a Cruz de madeira que adornava o altar, e que agora atravessa suas vísceras. Jason flexiona as pernas e segura a cruz na vertical, fazendo com que ela atravesse completamente o tronco de Darrel, e então pula, alcançando o teto da catedral e fincando a cruz lá. O sacerdote ainda se debate por alguns instantes, mas não resiste. O sangue de Darrel jorra no rosto de Rhodes, que lambe o próprio lábio ensangüentado e gargalha freneticamente. Jason então salta de volta ao chão, já em sua forma humana.
- Quem diria? Uma estaca de madeira no coração. – Jason ri e se abaixa para pegar o seu olho esquerdo. Coloca-o no bolso e então sai do templo pelos fundos. A chuva continua. Ele caminha por vários minutos até encontrar seu carro, nos limites da cidadezinha, evitando ser visto por alguém... Afinal, seria muito difícil explicar por que estava completamente ensangüentado e com um olho a menos, além da roupa rasgada e do cheiro de pólvora.
Missão completa... Vingança realizada. Com certeza o Padrinho ia ficar muito “chateado” em perder um de seus homens mais influentes no México. Agora era só voltar ao foco original e encontrar Ghastey.Jason chega até o veículo e começa a catar as chaves no bolso, quando escuta o som de um revolver sendo engatilhado a alguns metros de suas costas.Nenhum dos dois se mexe.O atirador segura a arma com mais firmeza e começa a respirar tão rápido que parece bufar.Jason sorri.

...

- É você Satanás?